quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Mande nos seus lucros

Responda rápido: o que você faria se tivesse de pegar oito ônibus por dia e todo seu dinheiro não fosse suficiente sequer para comprar um Fusca velho?
Você encorajaria um médico a mudar de ramo e investir em restaurantes?
Acredita que um legítimo português possa ser um grande cozinheiro árabe?
Levaria a sério se alguém lhe dissesse que uma rede de restaurante árabe, brasileira, um dia seria a maior do mundo?
Consegue imaginar que uma única loja conseguiu transformar-se em 204 lojas em 15 anos (mais de uma loja por mês) sem nenhum centavo de empréstimo?
Você apostaria num produto desconhecido se dissessem a você que ele seria o mais vendido no Brasil?
Com um investimento de 30 mil dólares, você saberia como conquistar cem milhões de clientes e gerar nove mil empregos diretos?
Demais para sua cabeça? Então compre uma esfiha, tome um suco natural, relaxe e continue lendo. Você vai descobrir como tudo isso é perfeitamente possível.

Oito ônibus por dia. Esse era o meio de transporte que Alberto Saraiva utilizava em 1970. Nos bolsos vazios, os trocados somados não comprariam um fusquinha velho. Nascido de uma família humilde em Portugal, chegou ao Brasil ainda criança e foi criado em Santo Antônio da Platina, interior do Paraná, onde o pai era representante de doces e balas. Por conta dos estudos de Alberto, os Saraiva mudaram-se para a capital paulista em 1973. “Vim para São Paulo e prestei vestibular para medicina durante dois anos consecutivos, não consegui entrar na faculdade, mas como o sonho é mais forte que qualquer coisa, tentei o terceiro ano e consegui entrar na Santa Casa”, lembra o empresário, fundador e presidente da maior rede de fast-food árabe do mundo.

A troca da medicina pelo comércio foi uma necessidade. Logo que chegou em São Paulo, seu pai comprou uma padaria, mas foi morto por um assaltante semanas depois. A partir dessa tragédia, Alberto Saraiva, que era o filho mais velho, teve de se responsabilizar pelo sustento da família. O que poderia ter sido uma entrega ao fracasso para muitos, serviu de estímulo para ele, que continuou tocando a padaria do pai, mas não deixou os estudos. Formou-se, chegou a clinicar durante dois anos, mas acabou seguindo o caminho do comércio. A dor pela morte do pai serviu para que descobrisse sua verdadeira vocação.

Os mandamentos da lucratividade
Crescer com qualidade. Com essa proposta a rede Habib’s desenvolveu uma estrutura voltada a atender seus clientes de forma personalizada, padronizando seus produtos e investindo continuamente nos setores de apoio que garantiram um alto padrão de qualidade em produtos e serviços.
A seguir, algumas considerações e lições sobre os mandamentos feitos pelo empresário:

1. O comércio como arte – Para Saraiva o comércio é uma arte por diversos motivos: primeiro porque as pessoas acham que é aquela frieza de comprar por um preço e vender por outro ou aquela coisa matemática de que quanto mais você cobra mais você ganha. “Na verdade não é nada disso, o grande sucesso do comércio é você obter lucro, mas a obtenção de lucro você consegue servindo as pessoas e não servindo o seu bolso, então quanto mais você oferece cobrando menos, mais você ganha”, defende. Em síntese, não cobrar a mais pelo algo a mais e sim fazer uma exceção, cobrar a menos pelo algo a mais que você dá ,esse é o grande diferencial. “Isso é uma arte, por que como toda arte, se você não tem o dom para fazer, o teu consciente não deixa que você faça.”

2. Priorize os 4 Qs – Este tópico corresponde ao quarto mandamento do livro que traz os dez mandamentos da lucratividade. Ele diz o seguinte: qualifique as vendas, priorize os 4 Qs (o que vende, quem vende, o quanto vende, quem cuida das vendas). Não adianta só vender, você tem de qualificar as vendas, e na verdade a qualificação passa por esses 4 Qs. Eu posso ter dois garçons atendendo o mesmo número de clientes e um vender muito mais bebida que o outro, isso faz uma diferença tremenda, o quanto vende é você dimensionar o quanto você precisa vender, você tem de ter meta, objetivo. As vendas precisam ter um constante cuidado no dia-a-dia, e uma análise no fim do mês, por isso quem cuida das vendas é importantíssimo dentro do processo.

3. Encarando a concorrência – “Normalmente encaro meus concorrentes com respeito, sem maiores preocupações, pois na verdade a concorrência está mais ligada a uma situação interna, sobre o que você é e o que você representa, quando você se cuida, se aprimora, se evolui e se preocupa com o cliente, você não tem preocupação com a concorrência”, afirma Saraiva. Ele acredita que as pessoas têm mais preocupação com a concorrência quando falham em algum setor em que o concorrente pode dominar. Mas para ele, a preocupação maior deve ser com a própria empresa e com aquilo que acontece dentro dela do que com o concorrente. “A maioria das pessoas fica preocupada em saber por que o concorrente tem mais movimento, tem menos, o que ele está fazendo, isso é uma coisa que a gente não faz, a gente acompanha, mas não que haja uma preocupação”.

4. Vender pelo menor preço possível sempre – Um dos mandamentos diz que deve-se vender aos menores preços possíveis, não vender mais barato. “A frase está muito relacionada com a origem de uma padaria que eu tinha, que ficava no meio de outras cinco padarias e era inteiramente ultrapassada. Eu tive a concorrência logo no meu primeiro negócio e uma das maneiras com a qual eu sobrevivi, pela necessidade, foi aprendendo que o preço é algo extremamente importante dentro do sucesso comercial. Aqui a gente nem sabe o que o concorrente cobra, nós cobramos os menores preços possíveis, independente de qualquer situação externa, concorrência, taxas, desemprego, inflação, nós não queremos saber de nada disso. Fazendo isso, nós vendemos 600 milhões de bib'sfihas ano passado”, explica Saraiva.
Em cinco anos, Alberto Saraiva teve 22 negócios diferentes. Como fazia Medicina, montava e vendia negócios com facilidade. Passou a ficar com eles apenas quando montou o primeiro Habib's.

5. Paixão pelo cliente – O conceito de respeito aos clientes defendido por Saraiva vai além do relacionamento. “Eu falo e às vezes as pessoas torcem o nariz: a paixão pelo cliente é uma questão de amor mesmo. Quando você tem paixão e amor aos seus clientes, você não consegue maltratá-lo, não consegue levar vantagem sobre eles, o que você oferece são vantagens e é aí que ganha dinheiro”. Ele enfatiza que não é indo atrás do lucro que vamos conquistá-lo e sim indo atrás das pessoas, daquilo que elas querem, do que mais necessitam e procuram. Para Saraiva, lucro não é prioridade. Prioridade é servir as pessoas.

6. Terceirize o medo – “Medo foi uma coisa na parte comercial que nunca tive, pelo contrário, as pessoas sempre tentavam me brecar. A ousadia é uma característica que eu sempre tive”. Saraiva chama atenção, no entanto, para a importância de estar sempre analisando e olhando o dia de amanhã, o que poderia ser, quais as conseqüências que poderá trazer, se der certo para onde você vai, se der errado qual seria a alternativa. Tudo com responsabilidade, nada de maluquice.

7. Metas determinadas – “Minha vida toda eu passei tendo metas”, confessa Saraiva. “Quando eu ganho aquelas agendas de ano, eu escolho a que se encaixa mais comigo e imediatamente o que eu coloco na última página da agenda são minhas metas, meus objetivos para aquele ano. Tenho as metas comerciais, as pessoais, as metas de empresário e as metas de caráter humanitário.” Ele acredita que isso é o que o motiva no trabalho do ano todo. “É a força da mente misteriosa que trabalha incansavelmente na realização dos seus sonhos, dos teus desejos e que surpreende você de uma maneira incompreensível”, afirma.

8. Aumente o seu negócio – Basicamente o que determina a expansão da rede é a oferta de pontos comerciais que o grupo consegue captar. “Na verdade nós nunca falamos vamos crescer aqui, vamos crescer ali, vamos fazer isso. A gente tem um planejamento para onde queremos ir e crescemos de acordo com a oferta dos melhores pontos comerciais que aparece”. O que determina a prioridade da expansão do Habib’s é a qualidade do ponto comercial que aparece, porque o sucesso de venda maior ou menor está intimamente ligado com o ponto comercial.

9. Vencer pelas próprias mãos – Saraiva afirma que para chegar lá tem de fazer muita coisa. “Para começar eu não tive herança, a minha origem é bastante humilde e eu já comecei com algo, como uma pessoa pobre, a única coisa que resta é vencer pelas próprias mãos”. Então o processo todo se inicia aí: na garra, vontade, na disposição redobrada na luta, no sonho que você deve ter, na motivação e na sua origem humilde, simples porque dá mais valor em tudo.

10. A lucratividade e o futuro do seu negócio – Saraiva defende que a visão do lucro sempre existiu. “Afinal quando você não tem o lucro, não tem futuro, porque o futuro da pessoa, a avaliação de um profissional é pelo lucro que ele traz para a empresa, a lucratividade é que dá o futuro da empresa”, defende, explicando que quando você não tem o lucro, não consegue pagar bons salários, não consegue ter pessoas de qualidade, não consegue crescer. “O lucro não é o objetivo final, não é o meio, não é na busca dele. O foco são as pessoas, é o cliente, aí ele aparece de surpresa para você”.

11. O peso do treinamento – O treinamento é importante na continuidade de uma idéia que você tem, porque senão ele quebra todo um conceito. Saraiva afirma que é quase que o aprimoramento, a manutenção daquilo que você escolhe, do que está fazendo. “Com o treinamento você tem o comprometimento principal do atendimento ao cliente, que é o meu décimo mandamento e o mais importante de todos. Nós não temos problema com qualidade de produto, de preço, cardápio, mas às vezes temos o problema de atendimento, principalmente com o item que se chama demora”. Foi por isso que nasceu o delivery 28 minutos.
O delivery do Habib’s nasceu em 2002 para matar um problema que era a demora. Em um mês, foram atendidos 250 mil pedidos.

12. Lidando com o dinheiro – Alberto acredita que o seu grande diferencial foi ter nascido pobre e conseguido enfrentar os problemas e obstáculos da vida como desafios. “Hoje eu encaro o dinheiro da mesma maneira de quando eu era pobre, só que com um pouquinho mais de utilização das coisas boas que o dinheiro trás”, afirma. Tem um capítulo no livro que diz “lidando com o dinheiro” e ensina como quebrar esse tabu que dinheiro traz felicidade, discórdia. “Dinheiro não trás nada disso, o que você precisa saber é lidar com ele, assim como você precisa lidar com seus filhos, sócios, esposa, tem de saber lidar com o dinheiro”.
A rede Habib’s institui o dia 16 de outubro como Bib’s Dia Genial, em que toda renda obtida com a venda das esfihas nas lojas da marca é destinada para o auxílio a entidades sociais.

Lucratividade e amor. Privilégio de poucos
A maioria das pessoas tem dificuldade de conquistar a lucratividade, porque pensa que seja uma coisa somente financeira, e é aí que está o erro. A afirmativa feita por Saraiva no livro Os Dez Mandamentos da Lucratividade, vem acompanhada de uma descoberta. “Descobri ao longo dos anos que lucratividade é algo que deve ser conquistado com o coração, assim como o amor, é preciso encanto na sua conquista”. Ficou complicado?
Então preste atenção nas considerações a seguir e acompanhe o raciocínio de Saraiva. Talvez você conclua que ele pode mesmo ter razão:
- A conquista da lucratividade e do amor é algo que fascina, algo misterioso guardado a sete chaves e que por isso mesmo, quase sem acesso. Privilégio de poucos.
- A conquista da lucratividade lembra da conquista do amor não correspondido. Quanto mais se quer, menos se tem; quanto mais se procura, menos se encontra; quanto mais se vai atrás, mais distante fica.
- Ambas conquistas ocorrem no mistério da incompreensão, na paixão ardente que se descobre, na atitude de entregar-se; são incompreensíveis; há que ter sentimentos e dar-se nessas conquistas.
- Tanto na conquista do amor como na da lucratividade, não basta estarmos presentes, é preciso muito mais. Na falta, sentimentos falta, o sufoco aumenta, o coração dispara, intensamente tudo explode.
- Na lucratividade como no amor; o óbvio deixa de ser, o “toma-lá-dá-cá” não existe, a matemática não funciona, o que você dá não diminui, só soma; muitas vezes são incompreensíveis, como a razão que se troca pela emoção.
- Lucratividade e amor são inesgotáveis, quanto mais, mais vem; mas não toleram desprezo e cobrança; se isso ocorre, desaparecem e deixam de existir.
- Amor e lucratividade – Difíceis de entender. Privilégio de poucos. Só quem ama sente, só quem tem entende.

Sobre a Autora:
Alessandra Assad
Diretora da AssimAssad Desenvolvimento Humano. Formada em Jornalismo, pós-graduada em Comunicação Audiovisual e MBA em Direção Estratégica, é professora universitária e em MBAs, colunista de vários meios de comunicação e palestrante.

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